Psycho-Pass – Cyberpunk, Noir e Niilismo
Entre outros ótimos animes da temporada de outubro, Psycho-Pass está entre os quais merecem maior destaque, principalmente pelo fato de Gen Urobuchi ser responsável pelo enredo e composição da obra. Pode-se resumir esse post em duas palavras: especulação e pesquisa. Muito do que está aqui são apenas pontos de vista, que podem vir a mudar depois do fim da série. Demorei um bom tempo para relacionar e tornar minhas suposições em argumentos pseudo-válidos, mas tentarei deixar tudo o mais claro possível.
Primeiro vamos nos situar ao mundo de Psycho-Pass, envolto de referências a variadas obras de ficção científica. Imagine um lugar em que as pessoas têm seu Coeficiente Criminal (Psycho-Pass) controlado por um sistema de nome Sibyl (referenciando as Sibilas, profetisas da mitologia grega) impedindo-as de cometerem crimes (fell like Minority Report). Isso é administrado por organizações como o DIC e a Segurança Pública – A.S.P, e patrocinado pelos “colarinhos-brancos”. Se a matiz de Psycho-Pass de uma pessoa fica turva, sua vida pode acabar em: uma terapia intensiva (incluindo confinamento perpétuo) ou virando carne-moída (literalmente) pelas armas chamadas Dominators. E assim segue a história com nossos dois personagens principais, a Inspetora novata Tsunemori Akane e o Coagente Kougami Shinya, que trabalham para o A.S.P.
Minha especulação quando vi a primeira cena do anime, é de que essa cidade faz parte de um “protótipo de sociedade perfeita”, ou também pode ser uma das últimas a aderirem ao projeto. Como podemos ver, eles se encontram isolados (resta saber se isso é premeditado ou não) e o sistema Sibyl foi implantado por volta de duas décadas (considerando a idade do Inspetor Ginoza). Estamos em uma cidade onde não ocorrem acidentes de trânsito (a maior parte dele é autônomo), ninguém precisa comprar roupas (todos carregam um dispositivo dentro do corpo que “implanta” a sensação de usá-las), assim como I.As, hologramas e todo tipo de realidade virtual. Mas, fica a dúvida: toda essa parafernália tecnológica permite que nos sintamos seguros e realizados? Pelo que vimos claramente até agora, não.
Muita gente pode assistir esse anime apenas pela diversão, o que não deixa de ser uma causa nobre. Mas também é legal notar que tudo o que está sendo mostrado nessa obra tem um fundamento, uma origem. Mesmo que não consigamos perceber tudo. E por mais que o cenário da trama seja no futuro, é possível sentir muitas “indiretas” para o estado em que se encontra a sociedade atual.
Mas alguém pergunta: de onde tiraram tudo isso? São inúmeras as referências que contribuíram para a série. Algumas são de livros (como “1984”, “Sonham os androides com ovelhas elétricas?” e “Neuromancer”), outras abordam filosofias como a “Utopia de Platão” (no episódio cinco, isso é citado pelo personagem Mido, que roubava avatares populares na rede). E com toda certeza há muitas outras.
Portanto, Psycho-Pass utiliza três vertentes principais:
Cyberpunk
É muito provável que você já tenha visto um filme, série ou livro de ficção científica que pertença a esse subgênero que mescla elementos de romances policiais, film noir e prosa pós-moderna. O Cyberpunk enfoca o desenvolvimento tecnológico como causa de desintegração/radicalismo da ordem social.
Os personagens são na maioria anti-heróis, seres distantes e marginalizados (em PP todos os Coagentes são considerados cães de Sibyl) que vivem em futuros despóticos (como vimos no episódio 14, o sistema apresenta uma “falsa segurança” extremamente totalitarista) onde o cotidiano sofre o impacto da tecnologia e modificação invasiva do corpo humano.
Recomendo lerem mais sobre o Cyberpunk, que como qualquer subgênero, possui várias facetas e ramificações.
Noir
É um estilo associado primeiramente aos filmes policias em preto-e-branco, com suas “loiras fatais” e dramas inteligentes cheios de niilismo, desconfiança, paranoia e cinismo. Em Psycho-Pass podemos ver elementos noir no que se refere aos ângulos de câmera distintos, luz e sombra e “filmagens” através de vidros e espelhos.
Com relação ao enredo, o anime apresenta também flashbacks, assassinatos fatalistas, emboscadas e fracasso do protagonista (Deus Ex Machina está ocupado demais com as séries de aventura para ajudar a Akane).
Stress x Niilismo
O niilismo é mais complicado de entender, já que o mesmo foi conceituado de variadas formas pelos autores. Basicamente, é o ponto de vista de que qualquer crença ou valor são meramente infundados, resultando na percepção de que a existência não possui qualquer sentido ou utilidade. Isso pode resultar ou numa depressão profunda (como as várias pessoas catatônicas no hospital mostradas no episódio 07), ou num espírito absolutamente destrutivo e anarquista.
Em Psycho-Pass temos duas visões niilistas: a primeira consiste na aceitação e conformismo da sociedade de que “se Sibyl falou, que seja assim”, gerando o pensamento maniqueísta baseado no pensamento “se o Coeficiente Criminal de alguém é baixo, ela é uma pessoa boa, do contrário não é”. Desde o primeiro episódio isso é contestado, quando Akane impede que a garota sequestrada seja julgada e morta.
A segunda visão consiste no que o misterioso Makishima almeja, fazendo o que for preciso para que a sociedade volte a ser passional e independente (é o que ele diz, mas com certeza deve ter outro motivo). Como qualquer movimento revolucionário, muitas vidas são perdidas por uma causa que, como qualquer outra, possui pontos cegos e duvidosos.
Espera aí. Então qual dessas visões está certa? A primeira visão nos torna escravos da Sibyl. A segunda visão, nas mãos erradas, pode nos condenar. É certo mudar o curso da história? Ou é melhor se conformar para que não haja maiores tragédias? Esse sentimento de impotência, de querer mudar algo por um motivo incerto, causando eternas dúvidas. Isso é niilismo. Não ver sentido na vida. Questionar coisas sem solução.
Assim como Shinsekai e Robotics, Psycho-Pass é um anime que carrega tanta bagagem que deixa de ser apenas entretenimento. E acho que esse sentimento de inquietação presente em obras assim é algo que todos deveriam conhecer.
Depois desse post meio grandinho, agradeço a quem leu até o fim.
Aproveito para desejar uma boa viagem para a Fernanda, que parte rumo ao saudoso Japão! Aguardem as postagens dela!
Ja nee
UAU! QUE COISA MAIS LINDA DE LER PFVR, POST APROVADISSIMO KITSUNE-CHAN! ~caps off~. Explicou bem mais sobre as bases da série, do que própriamente a série isso vai ajudar muita gente que um dia vai assistir, ou até mesmo está assistindo.
Obrigada *-*
Desde dezembro estava com esse post na cabeça, feliz que tenha ficado bom ^^
Com toda certeza um dos animes de maiores destaques do final da temporada de 2012, apesar de muitos falarem alguns pontos negativos em relação a obra querer ser muito cult, descordo totalmente. Parabéns pelo post.
Discordo desse “ponto negativo” também.O que importa numa obra (seja ela animada, filmada ou escrita) é conseguir integrar todo esse tipo de referências sem comprometer o “feeling” da trama. Exemplo: você não precisa conhecer todas as referências que J.K Rowling se baseou para criar Harry Potter, a série não perde seu esplendor. Embora descobrí-las seja interessante para alguns (como eu hehe), muitas pessoas torcem o nariz para isso. Mas faz parte né.
Obrigada por comentar aqui no ringochi, Larissa 🙂
É exatamente isso, você não precisa saber os livros citados ou escritores citados em psycho-pass para entender a drama. Eu também amo da uma pesquisada sobre as referencias, ou autores citados seja em filme, livros ou animes, querendo ou não você sempre descobre coisas novas.
Que isso, virei aqui sempre que possível (:
Acabei de saber desse blog graças a um comentário no episódio 20 de Psycho-Pass no Anitube, fiquei feliz de ver que existe gente fazendo análises ricas e interessantes sobre o mundo do entretenimento japonês fora do eixo Genkidama… vou dar uma olhadas nos seus demais posts.
Nossa, não tenho palavras para descrever como me sinto ao ler comentários assim. Sério.
É bom saber que estamos fazendo um bom trabalho. Faz uns 7 meses que comecei a blogar aqui no ringochi (ainda tenho muito a melhorar), e sinto prazer em fazer isso . Infelizmente, não temos muito tempo livre para sempre estar postando algo novo para vocês. Mas, graças ao apoio dos parceiros e leitores, vamos levando… Obrigada por comentar e volte sempre ^^
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